domingo, 18 de julho de 2010

ANISTIA, 30 ANOS DEPOIS



Por Augusto de Paula*


Que anistia temos e a que sempre desejamos e lutamos.


O movimento da anistia surgiu na segunda metade dos anos 70, inicialmente de forma tímida e com alguma resistência por parte mesmo de alguns segmentos da esquerda. A luta pela anistia nasce com o Movimento Feminista Brasileiro tendo à frente Tereza Zerbini líder e fundadora do Movimento Feminino pela Anistia no Brasil. Só alguns anos depois, isto é, em 1978, é que são criados os Comitês Brasileiros pela Anistia em todo o Brasil.


É importante buscar entender a anistia dentro de suas limitações, alias, elas são grandes, mas no primeiro momento não foram percebidas.


A anistia que em princípio significa perdão concedido pelo poder público em nome da harmonia social, teve, contudo, entre nós, outro significado: na época, os militares ainda detentores do poder - poder usurpado do povo com o golpe de 64 -, buscou muito mais encontrar um ponto comum ente os perseguidos políticos e seus torturadores, nas perspectivas da entrega do poder aos civis,isto porque já era impossível continuar a governar o país com a ditadura.


Enquanto os movimentos populares e organizados lutavam por uma anistia ampla e irrestrita, o governo, com seus aliados, restringiam o seu alcance, excluindo os militantes oposicionistas da ditadura militar que pegaram em armas, e incluíam de forma sórdida seus algozes, os verdadeiros terroristas que o Brasil conheceu: os TORTURADORES.


Essa situação se torna muito mais evidente depois de quase 30 anos da anistia quando ainda se discute se é possível ou não processar e julgar os torturadores. E toda essa discussão chegou, inclusive, ao Supremo Tribunal Federal - STF.


Outra coisa importante para se compreender verdadeiramente a anistia no Brasil é retornar as discussões travadas no fim dos anos 79 quando foi promulgada a Lei da Anistia, sob a força de toda a mobilização nacional em torno da bandeira da ANISTIA AMPLA GERAL E IRRESTRITA.


Aqui vale um parênteses – Theodomiro Romeiro dos Santos foi o primeiro brasileiro condenado à morte naquele período, com base na famigerada Lei de Segurança Nacional. Sua pena tinha sido comutada por prisão perpetua e mais tarde reduzida para trinta anos. Depois de nove anos de cumprimento de pena, mais as reduções e, por conta da nova Lei, foi requerida à sua liberdade condicional. O juiz auditor em conversa com os advogados e familiares, inicialmente, afirmou que tudo que fosse requerido e estivesse dentro da Lei seria concedido, só que, depois, em despacho, ele afirmou: “se o governo não vai conceder anistia ampla e geral, não iria soltar Theodomiro”.


A decisão do juiz auditor, bem como suas declarações, fizeram com que a busca da liberdade como dizíamos na época, se tornasse realidade e Theo, como era chamado pelos amigos, saiu da Lemos Brito buscando exílio na Nunciatura Apostólica – representação diplomática do Vaticano, indo posteriormente para o México, terminando na França, onde ficou exilado até poder retornar ao Brasil na segunda metade dos anos 80, o que prova a limitação e o alcance da anistia no Brasil.


Logo após o retorno do exílio Thedomiro Romeiro dos Santos fez vestibular para Direito e hoje é juiz do Trabalho em Recife, Estado de Pernambuco.


A anistia da forma mesquinha como foi aprovada pelo Congresso Nacional, atingiu apenas os militantes presos ou exilados condenados apenas por um dos artigos da Lei de Segurança Nacional, era o artigo 43 que considerava crime organizar ou tentar reorganizar partidos ou organizações postas na clandestinidade. A pena prevista era de 2 a 5 anos de reclusão. Isso, na prática, significava que apenas uns pouco militantes presos seriam postos em liberdade, e todos os demais continuariam presos; mas como o governo militar resolveu fazer política e não apenas reprimir matando e torturando, criou uma nova Lei de Segurança Nacional reduzindo significativamente as penas previstas na Lei anterior.


Com as reduções e adequação das penas, com base na nova Lei, a grande maioria dos presos políticos pode requerer a liberdade condicional na medida em que, também, esta mesma maioria já estava presa a mais de 9 anos. Só assim, efetivamente, os cárceres da ditadura começaram a se esvaziar, passando a imagem da conquista da anistia tão buscada pelo povo brasileiro naquele tempo.


E é justo, por isso, que até hoje, trinta anos depois, ainda estejamos discutindo o verdadeiro alcance da Lei de Anistia.


Hoje são os torturadores que buscam ser alcançados pela Lei da Anistia, esquecendo e tentando enganar a todos, principalmente as suas vítimas, mas não podem minimizar o fato de que a tortura é crime hediondo, imprescritível e considerado de lesa humanidade.


* Augusto de Paula é Advogado e militante na luta pelos direitos humanos e um dos fundadores do Comitê Brasileiro pela Anistia Ampla Geral e Irrestrita na Bahia.


REFERÊNCIAS


Lei da Anistia – Lei 6.683 de 28 de agosto de 1978


Decreto-Lei n. 898 de 29 de setembro de 1969 ( Lei de Segurança Nacional )


Lei n. 6.620 de 17 de dezembro de 1978 ( Nova Lei de Segurança Nacional )


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