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ESPAÇO ALTERNATIVO DA REDE
domingo, 21 de novembro de 2010
terça-feira, 17 de agosto de 2010
domingo, 8 de agosto de 2010
Alessandra Terribili: Uma velha história
Nos anos 80, a luta contra a violência contribuiu para fortalecer e consolidar o feminismo no Brasil. As mortes de Ângela Diniz (1979) e de Eliane de Gramond (1981) por seus ex-maridos chocaram o Brasil. Eram mulheres que puseram fim a seus casamentos, e, além da brutalidade dos assassinatos, os dois casos envolviam pessoas conhecidas da opinião pública, o que lhes conferiu ainda mais “notoriedade”. "Quem ama não mata" era a resposta dada pelas feministas àqueles que sugeriam que os homens matavam “por amor”.
Mas não tardou a tentativa de transformar as vítimas em rés, “compreendendo” o criminoso, que teria “perdido a cabeça” por ação delas. Organizadas, as mulheres repudiaram o machismo que levou Ângela e Eliane à morte, e que, depois, buscou incessantemente justificar essas mortes com base na conduta das vítimas. A tal defesa da honra era reivindicada. O movimento de mulheres não se calou e colocou em questão as insígnias do "em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher" ou a ideia de que "um tapinha não doi".
O tempo passou e, em 2000, a própria mídia foi pano de fundo para um crime análogo. A jornalista Sandra Gomide foi morta pelo ex-namorado, Pimenta Neves, então diretor de redação de O Estado de São Paulo. O assassinato aconteceu precisamente porque o namoro acabou. Por conta disso, ela sofreu agressões físicas e verbais, perdeu seu emprego, foi perseguida. Neves chegou a ameaçar de retaliações qualquer pessoa que oferecesse trabalho a Sandra. Pela mídia, a moça chegou a ser tratada como "aquela que namorou com o chefe para subir na vida".
Em 2008, outro episódio de violência contra mulher gerou comoção nacional. Eloá Pimentel, com seus 15 anos, praticamente foi assassinada ao vivo e em rede nacional pelo ex-namorado, que a sequestrou e a manteve em cativeiro por cinco dias. A agonia da menina foi acompanhada em tempo real, e ao se tornar a personagem central de uma história dramática, ela, como as já citadas, teve sua vida exposta e sua conduta julgada, apresentada como principal fundamento do comportamento agressivo de seu assassino.
Há poucos meses, a vítima foi Maria Islaine, cabelereira, morta pelo ex-marido diante de câmeras que ela mesma mandou instalar no salão onde trabalhava, julgando que essa atitude a protegeria da violência anunciada. Dias atrás, tivemos a infelicidade de testemunhar o advogado do assassino defendendo seu cliente com o bom e velho “ela provocou”.
Eliza e Mércia
Agora, a mídia tem apresentado as histórias de Eliza Samudio e de Mércia Nakashima como se fossem romances policiais. Convida-nos a acompanhar cada momento, provoca comoção, sugere respostas, vasculha a vida das mulheres mortas e as expõe a julgamento público, sem direito de defesa. A tragédia é exaustivamente explorada, e no final, a lição que fica é: elas procuraram.
Mércia morreu, aparentemente, porque rejeitou seu ex-namorado. Cometeu o desaconselhável equívoco de querer sua vida para si mesma, de não aceitar perseguições, sanções ou intimidações. Entretanto, tem-se falado em traição e ciúmes. E lá vem, de novo, a conversa fiada da defesa da honra. Mas é Mércia quem não está mais aqui para defender a sua.
De Eliza, disse-se de tudo: maria-chuteira, garota de programa, abusada, oportunista. Acontece que não importa. Não importa se ela foi garota de programa, se era advogada, modelo, atriz, estudante ou deputada. Ela está morta. E morreu, aparentemente, porque o pai de seu filho não queria arcar com as obrigações legais e éticas de tê-la engravidado.
Ela nunca vai poder se defender das acusações póstumas. Não vai ao “Superpop” defender sua versão ou sua história. Não vai estampar a capa de “Contigo”, acompanhada de frases de impacto entre aspas. Ela está morta, e o que ela fez ou deixou de fazer, pouco importa agora. E seria prudente, inclusive, evitar julgá-la pelo crime que a matou.
Mais uma vez, a história se repete. Mulheres são mortas por homens com quem se envolveram. Assassinos frios, esses homens tiraram a vida de mulheres confiando na impunidade, porque há quem os “compreenda”. A morte de Eliza e de Mércia parece ter sido calculada e premeditada. E mesmo assim, segue ecoando a ideia de que a culpa é delas, que elas procuraram, que elas provocaram.
O espetáculo da morte
Infelizmente, histórias como as de Eliza, Mércia, Eloá, Maria, Sandra, Ângela e Eliane são muito mais comuns do que se imagina. E antes de culminar em assassinato, outras formas de violência foram praticadas contra cada uma delas, como acontece com muitas – as que morrem e as que se salvam.
A espetacularização promovida pela mídia, no entanto, faz parecer que são histórias ímpares e distantes do cotidiano da vida real. Como se o perigo não morasse ao lado, como se muitas não dormissem com o inimigo. Na sua família, na sua vizinhança, no seu local de trabalho, no seu círculo de amigos, certamente há casos de violência contra mulheres, e certamente você ouviu falar de pelo menos um deles. Em recente levantamento, a ONG Centro pelo Direito à Moradia contra Despejos apontou que uma mulher é agredida a cada 15 segundos no Brasil, e uma em cada quatro afirma já ter sofrido violência. Há que se considerar também que existem as que não afirmam – por medo ou vergonha.
Essas mulheres não são co-autoras de seu assassinato. É recorrente a trama montada para torná-las rés, para justificar suas mortes nas ações delas mesmas, para tolerar a violência. “Que sirvam de exemplo”, parece que dizem.
Num mundo em que a desigualdade entre mulheres e homens se expressa visivelmente desde na divisão das tarefas domésticas até no controle dos corpos delas pela Igreja ou pelo Estado, passando pela realidade de violência e pela discriminação no mercado de trabalho ou por serem tratadas como objetos descartáveis na rua e na TV; ninguém pode dizer que não sabia; nem fazer piadinhas que celebram os casos. São mulheres de carne e osso, não são personagens de novela.
São cúmplices dessa violência todos os que a toleram ou que buscam subterfúgios no comportamento da vítima para declará-la culpada por sua própria morte. São cúmplices silenciosos, igualmente, aqueles que fingem que machismo, discriminação e opressão são peças de ficção.
Alessandra Terribili, jornalista, integrante do coletivo nacional de mulheres do PT
sábado, 7 de agosto de 2010
quinta-feira, 29 de julho de 2010
Gramsci: Odeio os indiferentes
Antonio Gramsci
11 de Fevereiro de 1917
Odeio os indiferentes. Como Friederich Hebbel acredito que "viver significa tomar partido". Não podem existir os apenas homens, estranhos à cidade. Quem verdadeiramente vive não pode deixar de ser cidadão, e partidário. Indiferença é abulia, parasitismo, covardia, não é vida. Por isso odeio os indiferentes.
A indiferença é o peso morto da história. É a bala de chumbo para o inovador, é a matéria inerte em que se afogam freqüentemente os entusiasmos mais esplendorosos, é o fosso que circunda a velha cidade e a defende melhor do que as mais sólidas muralhas, melhor do que o peito dos seus guerreiros, porque engole nos seus sorvedouros de lama os assaltantes, os dizima e desencoraja e às vezes, os leva a desistir de gesta heróica.
A indiferença atua poderosamente na história. Atua passivamente, mas atua. É a fatalidade; e aquilo com que não se pode contar; é aquilo que confunde os programas, que destrói os planos mesmo os mais bem construídos; é a matéria bruta que se revolta contra a inteligência e a sufoca. O que acontece, o mal que se abate sobre todos, o possível bem que um ato heróico (de valor universal) pode gerar, não se fica a dever tanto à iniciativa dos poucos que atuam quanto à indiferença, ao absentismo dos outros que são muitos. O que acontece, não acontece tanto porque alguns querem que aconteça quanto porque a massa dos homens abdica da sua vontade, deixa fazer, deixa enrolar os nós que, depois, só a espada pode desfazer, deixa promulgar leis que depois só a revolta fará anular, deixa subir ao poder homens que, depois, só uma sublevação poderá derrubar.
A fatalidade, que parece dominar a história, não é mais do que a aparência ilusória desta indiferença, deste absentismo. Há fatos que amadurecem na sombra, porque poucas mãos, sem qualquer controle a vigiá-las, tecem a teia da vida coletiva, e a massa não sabe, porque não se preocupa com isso. Os destinos de uma época são manipulados de acordo com visões limitadas e com fins imediatos, de acordo com ambições e paixões pessoais de pequenos grupos ativos, e a massa dos homens não se preocupa com isso.
Mas os fatos que amadureceram vêm à superfície; o tecido feito na sombra chega ao seu fim, e então parece ser a fatalidade a arrastar tudo e todos, parece que a história não é mais do que um gigantesco fenômeno natural, uma erupção, um terremoto, de que são todos vítimas, o que quis e o que não quis, quem sabia e quem não sabia, quem se mostrou ativo e quem foi indiferente. Estes então zangam-se, queriam eximir-se às conseqüências, quereriam que se visse que não deram o seu aval, que não são responsáveis.
Alguns choramingam piedosamente, outros blasfemam obscenamente, mas nenhum ou poucos põem esta questão: se eu tivesse também cumprido o meu dever, se tivesse procurado fazer valer a minha vontade, o meu parecer, teria sucedido o que sucedeu? Mas nenhum ou poucos atribuem à sua indiferença, ao seu cepticismo, ao fato de não ter dado o seu braço e a sua atividade àqueles grupos de cidadãos que, precisamente para evitarem esse mal combatiam (com o propósito) de procurar o tal bem (que) pretendiam.
A maior parte deles, porém, perante fatos consumados prefere falar de insucessos ideais, de programas definitivamente desmoronados e de outras brincadeiras semelhantes.
Recomeçam assim a falta de qualquer responsabilidade. E não por não verem claramente as coisas, e, por vezes, não serem capazes de perspectivar excelentes soluções para os problemas mais urgentes, ou para aqueles que, embora requerendo uma ampla preparação e tempo, são todavia igualmente urgentes. Mas essas soluções são belissimamente infecundas; mas esse contributo para a vida coletiva não é animado por qualquer luz moral; é produto da curiosidade intelectual, não do pungente sentido de uma responsabilidade histórica que quer que todos sejam ativos na vida, que não admite agnosticismos e indiferenças de nenhum gênero.
Odeio os indiferentes também, porque me provocam tédio as suas lamúrias de eternos inocentes. Peço contas a todos eles pela maneira como cumpriram a tarefa que a vida lhes impôs e impõe quotidianamente, do que fizeram e sobretudo do que não fizeram. E sinto que posso ser inexorável, que não devo desperdiçar a minha compaixão, que não posso repartir com eles as minhas lágrimas. Sou militante, estou vivo, sinto nas consciências viris dos que estão comigo pulsar a atividade da cidade futura que estamos a construir.
Nessa cidade, a cadeia social não pesará sobre um número reduzido, qualquer coisa que aconteça nela não será devido ao acaso, à fatalidade, mas sim à inteligência dos cidadãos. Ninguém estará à janela a olhar enquanto um pequeno grupo se sacrifica, se imola no sacrifício. E não haverá quem esteja à janela emboscado, e que pretenda usufruir do pouco bem que a atividade de um pequeno grupo tenta realizar e afogue a sua desilusão vituperando o sacrificado, porque não conseguiu o seu intento.
Vivo, sou militante. Por isso odeio quem não toma partido, odeio os indiferentes.
Primeira Edição: La Città Futura, 11-2-1917
Origem da presente Transcrição: Texto retirado do livro Convite à Leitura de Gramsci"
Tradução: Pedro Celso Uchôa Cavalcanti.
Transcrição de: Alexandre Linares para o Marxists Internet Archive
HTML de: Fernando A. S. Araújo
domingo, 18 de julho de 2010
ANISTIA, 30 ANOS DEPOIS
Por Augusto de Paula*
Que anistia temos e a que sempre desejamos e lutamos.
O movimento da anistia surgiu na segunda metade dos anos 70, inicialmente de forma tímida e com alguma resistência por parte mesmo de alguns segmentos da esquerda. A luta pela anistia nasce com o Movimento Feminista Brasileiro tendo à frente Tereza Zerbini líder e fundadora do Movimento Feminino pela Anistia no Brasil. Só alguns anos depois, isto é, em 1978, é que são criados os Comitês Brasileiros pela Anistia em todo o Brasil.
É importante buscar entender a anistia dentro de suas limitações, alias, elas são grandes, mas no primeiro momento não foram percebidas.
A anistia que em princípio significa perdão concedido pelo poder público em nome da harmonia social, teve, contudo, entre nós, outro significado: na época, os militares ainda detentores do poder - poder usurpado do povo com o golpe de 64 -, buscou muito mais encontrar um ponto comum ente os perseguidos políticos e seus torturadores, nas perspectivas da entrega do poder aos civis,isto porque já era impossível continuar a governar o país com a ditadura.
Enquanto os movimentos populares e organizados lutavam por uma anistia ampla e irrestrita, o governo, com seus aliados, restringiam o seu alcance, excluindo os militantes oposicionistas da ditadura militar que pegaram em armas, e incluíam de forma sórdida seus algozes, os verdadeiros terroristas que o Brasil conheceu: os TORTURADORES.
Essa situação se torna muito mais evidente depois de quase 30 anos da anistia quando ainda se discute se é possível ou não processar e julgar os torturadores. E toda essa discussão chegou, inclusive, ao Supremo Tribunal Federal - STF.
Outra coisa importante para se compreender verdadeiramente a anistia no Brasil é retornar as discussões travadas no fim dos anos 79 quando foi promulgada a Lei da Anistia, sob a força de toda a mobilização nacional em torno da bandeira da ANISTIA AMPLA GERAL E IRRESTRITA.
Aqui vale um parênteses – Theodomiro Romeiro dos Santos foi o primeiro brasileiro condenado à morte naquele período, com base na famigerada Lei de Segurança Nacional. Sua pena tinha sido comutada por prisão perpetua e mais tarde reduzida para trinta anos. Depois de nove anos de cumprimento de pena, mais as reduções e, por conta da nova Lei, foi requerida à sua liberdade condicional. O juiz auditor em conversa com os advogados e familiares, inicialmente, afirmou que tudo que fosse requerido e estivesse dentro da Lei seria concedido, só que, depois, em despacho, ele afirmou: “se o governo não vai conceder anistia ampla e geral, não iria soltar Theodomiro”.
A decisão do juiz auditor, bem como suas declarações, fizeram com que a busca da liberdade como dizíamos na época, se tornasse realidade e Theo, como era chamado pelos amigos, saiu da Lemos Brito buscando exílio na Nunciatura Apostólica – representação diplomática do Vaticano, indo posteriormente para o México, terminando na França, onde ficou exilado até poder retornar ao Brasil na segunda metade dos anos 80, o que prova a limitação e o alcance da anistia no Brasil.
Logo após o retorno do exílio Thedomiro Romeiro dos Santos fez vestibular para Direito e hoje é juiz do Trabalho em Recife, Estado de Pernambuco.
A anistia da forma mesquinha como foi aprovada pelo Congresso Nacional, atingiu apenas os militantes presos ou exilados condenados apenas por um dos artigos da Lei de Segurança Nacional, era o artigo 43 que considerava crime organizar ou tentar reorganizar partidos ou organizações postas na clandestinidade. A pena prevista era de 2 a 5 anos de reclusão. Isso, na prática, significava que apenas uns pouco militantes presos seriam postos em liberdade, e todos os demais continuariam presos; mas como o governo militar resolveu fazer política e não apenas reprimir matando e torturando, criou uma nova Lei de Segurança Nacional reduzindo significativamente as penas previstas na Lei anterior.
Com as reduções e adequação das penas, com base na nova Lei, a grande maioria dos presos políticos pode requerer a liberdade condicional na medida em que, também, esta mesma maioria já estava presa a mais de 9 anos. Só assim, efetivamente, os cárceres da ditadura começaram a se esvaziar, passando a imagem da conquista da anistia tão buscada pelo povo brasileiro naquele tempo.
E é justo, por isso, que até hoje, trinta anos depois, ainda estejamos discutindo o verdadeiro alcance da Lei de Anistia.
Hoje são os torturadores que buscam ser alcançados pela Lei da Anistia, esquecendo e tentando enganar a todos, principalmente as suas vítimas, mas não podem minimizar o fato de que a tortura é crime hediondo, imprescritível e considerado de lesa humanidade.
* Augusto de Paula é Advogado e militante na luta pelos direitos humanos e um dos fundadores do Comitê Brasileiro pela Anistia Ampla Geral e Irrestrita na Bahia.
REFERÊNCIAS
Lei da Anistia – Lei 6.683 de 28 de agosto de 1978
Decreto-Lei n. 898 de 29 de setembro de 1969 ( Lei de Segurança Nacional )
Lei n. 6.620 de 17 de dezembro de 1978 ( Nova Lei de Segurança Nacional )
sexta-feira, 9 de julho de 2010
SERVIDOR OU TRABALHADOR PÚBLICO?
As relações sociais senhorias por trás do trabalho judiciário: servidor ou trabalhador público? – parte 1
A assimetria das relações sociais dentro das instituições estatais é grande e persistente, apesar de mudanças trazidas com a constitucionalização do direito à sindicalização dos trabalhadores públicos, quando estes começaram a se organizar como categoria ocupacional. Durantes esses anos houve grandes transformações no mundo da produção e do trabalho que abalaram, em parte, os conceitos de profissão, categoria ocupacional e classes sociais. Contudo, permanece intacto o conceito de três séculos: a sociedade moderna é uma sociedade de classes, capitalista, assentada na compra do trabalho.
Os trabalhadores do setor de serviços no geral e, em particular, os trabalhadores do judiciário, têm merecido pouca atenção dos estudiosos em ciências políticas e sociais; provavelmente, por exercerem atividades terciárias; parece, em princípio, que seus trabalhadores, com pouco história de organização e luta, não têm ainda potencial político e ideológico suficiente, de pressão, para alterar radicalmente as relações sociais do mundo contemporâneo, ainda que em países industrializados como o Brasil, a população de trabalhadores de serviços – onde estão inseridos os serviços públicos – seja o dobro da população de trabalhadores nas atividades de transformação. Essa desatenção para com os trabalhadores de serviços inclui os trabalhadores públicos que reúnem categorias ocupacionais numerosas, técnica e socialmente importantes, como a de profissionais da educação, da saúde, da segurança e da justiça.
Lembrando que o Estado inculcou na mente dos seus trabalhadores que eles não são iguais aos trabalhadores que vendem força de trabalho nas atividades de transformação; conseqüentemente, não comporiam com eles uma mesma classe social, posto serem agentes do Estado, concepção ideológica e residual de casta ou estamento de classe([i] (ver, HIRANO, S. Castas, Estamentos e Classes Sociais: introdução ao pensamento sociológico de Marx e Weber. 3ª Ed. Campinas: Unicamp, 2002), onde pontificam hierarcas com togas, becas e uniformes que, não raramente funcionam como guarda pretoriana. A herança escravocrata contribuiu muito para induzir essa ideologia de servidão nos serviços públicos brasileiros.
O patronato e seus tecnocratas, incrustados no aparelho estatal, sabem disso, tanto que fazem de tudo para impedir a tomada de consciência dos trabalhadores públicos, aliciando-os com cargos em comissão, adicionais de função e penduricalhos de todos os tipos. Contudo, apesar de "prêmios" e retaliações que amarram muitos trabalhadores públicos à condição de servidão, eles vêm se identificando na ação e ideologicamente como classe trabalhadora e rompendo com a subalternidade extremada. A ação adotada pela cúpula do Tj-BA no corte do ponto da última foi reveladora dessa relação autoritaria e patronal para com os trabalhadores do judiciário baiano.
Por Antemar Campos - bacharel em Sociologia e licenciado em Ciências Sociais pela UFBA.